Havia no alto das montanhas da China antiga, um grande mestre na arte
do arco e flecha que por muitos anos ensinava seus discípulos
a manejarem o arco como arte, maestria e meditação.
Já
havia ensinado a muitos alunos, quando um príncipe de uma grande
família da região do norte do país resolveu ir
até ele para se aperfeiçoar na arte do arco e flecha.
Era uma rapaz forte, de opinião forte, e não aceitava
qualquer ensinamento sem que tivesse uma boa explicação.
O mestre
muito paciente lhe ensinou várias técnicas e o rapaz era
realmente perseverante e treinava intensamente, sem descanso.
Seus amigos ficavam espantados, pois o príncipe rapidamente se
tornou o aluno mais preciso e o mais aguçado na arte da mira
e na precisão da flecha. Era de pouca conversa e sempre estava
treinando dia e noite.
Uma noite
o mestre chegou perto dele e disse:
- Huang Kiu, porque você está treinando tão intensamente?
Com quem está competindo?
- Ninguém disse o príncipe, estou apenas treinando, pois
quero ser o melhor arqueiro da China, e serei.
- Então, disse o mestre, veja como sua mente está presa
nesse desejo, o desejo de ser melhor que todos os outros. Porque não
apenas se aperfeiçoar na arte do arco e flecha e respeitar o
grande Tao? A flecha flui por si mesma, não precisa nenhum esforço.
O dia nasce por si mesmo, a noite nasce por si mesma. Nenhum esforço
é necessário. Onde há esforço existe a mente
envolvida, controlando, o fluxo foi quebrado.
- Isso não me importa, disse Huang Kiu. Tudo isso é bobagem.
Quero me tornar o melhor arqueiro e vou.
Na verdade, vejo que já sou o melhor dos seus alunos aqui, agora
só me falta superar o senhor. Quando conseguir, partirei. Terei
cumprido meu ciclo aqui.
- Então, disse o mestre, treine mais, treine muito mais, e você
me superará.
E assim
foi feito. Huang Kiu treinava alucinadamente, dia e noite para superar
o seu mestre. Os outros alunos se afastaram dele, e viram que ele precisava
ter sempre alguém para superar, isso lhe dava a sensação
de poder, e ele se sentia desafiado.
Um dia,
Huang Kiu chegou perto do seu mestre e disse:
- Mestre, sinto que já o alcancei. Vamos por a prova?
- Sim, claro vamos por a prova sua superioridade, disse o mestre.
- Então vamos até o alvo mais distante que lhe mostrarei
que já estou pronto.
- Sim, disse o mestre, vamos ao alvo mais distante.
E foram os dois, ao grande campo verde, onde o alvo estava pronto a
espera dos dois arqueiros. Era realmente distante e somente um grande
arqueiro conseguiria acertar o alvo naquela distância.
Huang Kiu se posicionou e disparou a flecha, que foi certeira na mosca.
Não se dando por satisfeito, se posicionou novamente e disparou
nova flecha que acertou rente a primeira.
O mestre ficou impressionado e disse:
- Huang Kiu você foi muito bem, muito bem mesmo...mas ainda não
está pronto.
- Como não, disse Huang Kiu, acertei na mosca a essa distância,
foram perfeitos meus disparos.
Não compreendo o que me falta?
- Venha comigo, e lhe mostrarei o que é a maestria.
E foram
os dois pelo penhasco caminhando, subindo pelas montanhas até
que se depararam com uma ponte frágil que ligava dois morros,
isso a uma grande altura, e lá em baixo passava um rio. O vento
soprava forte, as árvores e a ponte balançavam.Foi então
que o mestre disse:
- Vê, vai até o meio dessa ponte e dali acerte aquela árvore
do outro lado, quero ver a sua destreza de arqueiro aqui nesse lugar,
nessas condições.
Huang Kiu se assustou:
- Tenho
medo de altura, essa ponte não é segura, o vento está
forte, tudo balança, posso cair, nem sequer vejo bem o outro
lado a neblina me impede de ver com clareza. Isso é uma bobagem.
Não vou fazer, sou um grande arqueiro não preciso desse
treinamento nessas condições.
E se virou
para ir embora, quando viu o mestre no meio da ponte lançando
a flecha com total tranquilidade e precisão mesmo em meio a toda
aquela diversidade.
Huang Kiu
parou, ficou em silencio. Ali naquele instante percebeu que não
sabia nada sobre o caminho do arco e flecha. Ali viu como seu ego se
havia inflado e ele pode compreender que a mente serena é capaz
de vencer todas as adversidades do momento e permanecer fixa no alvo,
mesmo que tudo a volta esteja revolto, a paz interior não se
confunde, não se abala, ela é sempre presente e age de
acordo com o momento, em perfeita sintonia e precisão.
Quando o mestre retornou, Huang Kiu caiu aos seus pés e lhe pediu
perdão por ter sido tão arrogante.
- Mestre, me perdoe, agora compreendo o que queria me ensinar. Vejo
que fui um tolo e que não é por aquisição
de técnica e treinamento que se chega a maestria, mas pelo esvaziamento
do ego e pelo silencio da mente... pela ausência de esforço
e por se estar em paz, sereno e centrado... a flecha segue o seu caminho
por sí só...
- O mestre olhou no fundo dos seus olhos, e lhe disse:
- Vá, agora você aprendeu a lição. Agora
você é um verdadeiro arqueiro. Não há nada
mais a aprender.
O Verdadeiro arqueiro dispara com o coração...
O
Jovem Arqueiro - Conto Zen
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